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Observamos ainda que a publicização dos textos nesse blog atendem especificamente ao objetivo de propiciar a leitura prévia dos participantes do Círculo 2009. Os textos serão devidamente reorganizados e formatados com todas as notas e publicados em Caderno Especial para o evento.

A representação polêmica sobre o uso de estrangeirismos no Brasil feita por um jornalista norte-americano

Marina Célia Mendonça
Marina Gláucia Verzola
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Introdução
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Tem ganhado relevância, nas discussões da sociedade brasileira, o discurso sobre a promoção e a preservação da língua portuguesa. Grande parte dessas discussões aconteceu após o deputado federal Aldo Rebelo propor o Projeto de Lei nº 1676/99 (REBELO, 1999), por meio do qual propõe restrições ao do uso de estrangeirismos, principalmente os de língua inglesa.
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Nesse projeto, ele afirma que a imposição de uma língua é uma das maneiras de se dominar um povo, mesmo que isso ocorra de maneira lenta, e tenta mostrar que a língua portuguesa está sendo descaracterizada por causa da presença de palavras como "holding", "recall", "franchise", "coffee-break", "self-service". Rebelo acredita que os anglicismos são uma prática abusiva e enganosa, pois muitas vezes os encontramos em propagandas que dizem “on sale”, as quais podem iludir o consumidor que não possui conhecimento sobre línguas estrangeiras. A intenção confessa do projeto é promover, defender e proteger a língua portuguesa sem barrar sua evolução, pois se assume que a lei não se aplica “a palavras e expressões em língua estrangeira consagradas pelo uso, registradas no Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa” (REBELO, 1999). Além disso, o deputado afirma que, “na inexistência de palavra ou expressão equivalente em língua portuguesa, admitir-se-á o aportuguesamento da palavra ou expressão em língua estrangeira ou o neologismo próprio que venha a ser criado” (REBELO, 1999).
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Esse Projeto de Lei gerou polêmicas na sociedade letrada brasileira. Na mídia de referência, já se encontravam críticas ao uso do inglês nas diversas esferas de atividade – comercial, econômica, de informação etc. A iniciativa do deputado abriu um espaço maior ainda de discussão da questão, em especial por parte daqueles que consideravam a luta contra os estrangeirismos uma atitude muito complexa para ser resolvida por meio de um decreto. Os linguistas estão entre aqueles que encabeçaram um movimento contra a iniciativa em pauta: houve uma série de debates nas universidades e na mídia, houve documentos de desapreço à atitude, publicações em livros e revistas, entre outros. (MENDONÇA, 2006)
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Nosso objetivo neste artigo é analisar como esse acontecimento é ressignificado na mídia norte-americana, em novo contexto ideológico. Analisamos, neste trabalho, a matéria “English is spoken here: too much, some say” (publicada no jornal The New York Times on-line em 15 de maio de 2001) do jornalista norte-americano Larry Rohter, representante desse jornal no Brasil. Como parte da pesquisa sobre “A promoção e a preservação da Língua Portuguesa sob o olhar do outro”, que ora desenvolvemos, buscamos identificar a representação que faz o citado jornalista do projeto do deputado e da sociedade brasileira, nos conflitos ideológicos em que se constituem os discursos no contexto de imposição cultural da língua inglesa.
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A base teórica desta pesquisa é a concepção dialógica da linguagem, especialmente aquela que parte das reflexões produzidas pelo círculo de Bakhtin, composto principalmente pelos intelectuais russos Volochinov, Medvedev e Mikhail Bakhtin, sendo este a figura que mais se destacou no grupo. Nessa perspectiva, a linguagem é concebida como um fluxo discursivo em que as palavras dos outros são constitutivas das do “eu”; assim, uma palavra se constitui necessariamente a partir de, com e para outras palavras. A base teórica também compreende estudos de Jacqueline Authier-Revuz (1990) que, a partir das reflexões do Círculo de Bakhtin e da perspectiva psicanalítica de linha lacaniana, propõe o conceito de heterogeneidade enunciativa, a qual, para a autora, se divide em constitutiva, mostrada marcada e não-marcada.
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A metodologia utilizada é a proposta por Carlo Ginzburg (1989) para a pesquisa nas ciências humanas - Paradigma Indiciário. Em seu livro Mitos, emblemas, sinais: morfologia e história, no capítulo Sinais, raízes de um paradigma indiciário, Ginzburg explica que o modelo dá atenção ao particular, ou seja, àquilo que é diferente, pois são os sinais peculiares que mostram a singularidade. Ele diz que o pesquisador deve perseguir pegadas, pistas e indícios que permitam elaborar hipóteses sobre o todo dos dados.
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Uma das hipóteses de que partimos é que a matéria ressignifica o discurso presente no projeto de Aldo Rebelo e em suas declarações, bem como dados da mídia e polêmicas com os linguistas, segundo o lugar sócio-ideológico no qual o autor se posiciona: o do sujeito norte-americano, privilegiado, se comparado ao sujeito de nacionalidade brasileira, sendo o Brasil um país emergente no contexto político-econômico.
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Contextualização: os estrangeirismos na perspectiva do político e do linguista
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Na tentativa de delinear as vozes sociais com as quais a matéria analisada dialoga e as quais ressignifica, resumimos aqui uma polêmica representativa ocorrida no Brasil sobre a restrição ao uso de estrangeirismos.
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Trata-se da polêmica entre Aldo Rebelo e o linguista Carlos Alberto Faraco, que, no artigo “Guerras em torno da língua” escrito no jornal Folha de São Paulo, em 25 de março de 2001, faz um texto-resposta para o citado projeto do deputado federal. O linguista inicia seu texto dizendo que ainda hoje as línguas não são vistas como objeto de estudo da ciência, pois acredita-se que já tenha sido dito tudo a respeito da linguagem. A linguística, por exemplo, apesar de estar nas universidades há 40 anos, ainda não possui seu lugar na sociedade. De acordo com Faraco (2001), ela é responsável por um grande acervo de descrições do português e por produzir um quadro bastante delineado da diversidade linguística do país (em que se falam perto de 180 línguas, somando as línguas dos grupos europeus, asiáticos e indígenas), e mesmo assim, essa disciplina permanece invisível aos olhos do senso comum. Ele defende a idéia de que a Linguística ainda não conseguiu ocupar seu devido lugar na sociedade e que, por isso, prevalece-se o senso comum, ou seja, ainda não se veem diferentes discursos que dizem a língua no Brasil, apesar de eles existirem. Um exemplo disso dado pelo linguista é o próprio projeto de Rebelo que caminha livremente pelo Congresso, o que prova, para ele, que a questão linguística ainda não é assunto social. Faraco (2001) diz que o projeto mostra preconceitos e mitos sobre a linguagem e
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revela um indisfarçável desejo de controle social da pior espécie, daquele que, ignorando a heterogeneidade e a dinâmica da vida cultural, quer impor o homogêneo e o único. Todo gesto de legislar sobre a língua tem, aliás, essa triste característica. (FARACO, 2001)
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Retomando pesquisa realizada por uma destas pesquisadoras, podemos dizer que o linguista assume, nesse debate e em outros que tiveram lugar na mídia sobre o Projeto de Lei, o discurso a favor da abordagem científica das línguas (em defesa, portanto, dos estudos descritivos e/ou cientificamente embasados da Linguística, em oposição aos estudos normativos da gramática tradicional). Além disso, o linguista critica as políticas linguísticas autoritárias, com as quais identifica o Projeto de Lei em questão. (MENDONÇA, 2006)
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Pouco tempo depois, o jornal Folha de São Paulo divulgou um artigo de Rebelo intitulado A intriga das línguas, de 15 de abril de 2001, no qual percebemos outra resposta, mas desta vez de Rebelo a Faraco. O deputado defende seu projeto apoiando-se na idéia de que a língua é uma ferramenta de conquista. “A cultura dominante impõe seu vocabulário à cultura dominada. (...) Quando Portugal decidiu empreender a colonização, cuidou de providenciar um idioma para comunicação com os nativos.” (REBELO, 2001). Entretanto, desenvolve esse argumento não o considerando um caso de imposição linguística e cultural, ponto de vista que se encontra em estudos de linguistas, mas como “elemento decisivo na unidade nacional.” (MENDONÇA, 2006, p. 194)
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O deputado explica que o português falado no Brasil sempre aceitou contribuições de outras línguas como as indígenas e africanas, pois sempre, segundo ele, tivemos sabedoria de adaptá-las na pronúncia e na escrita e um bom exemplo disso seria a palavra futebol, que tomamos do inglês.
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A esse respeito, convém considerar que
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Rebelo responde a Faraco imbuído do espírito do purismo nacionalista, usando, sem os citar diretamente, discursos de escritores e gramáticos – estes mesmos que foram criticados por seu debatedor. Nessa paráfrase, reafirma o discurso da unidade da nação brasileira pela comunhão lingüística entre brancos, negros e índios, comunhão realizada pelo povo (...). Reafirma o discurso da unidade na diversidade, em que o português enriqueceu-se com as contribuições de outras línguas, mas permaneceu uno, “elemento decisivo da unidade nacional”. Considera a língua uma unidade, um bem intangível da pátria que deve ser preservado em sua pureza e valorizado como tal. Assim, só assume como positiva a influência passada de outras línguas no português. As influências contemporâneas não são aceitas. (MENDONÇA, 2006, p. 192-193)
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Dessa forma, encontramos, nesses dois textos que polemizam entre si, por um lado, uma postura que busca ver na interferência linguística um fato social e histórico que deve ser descrito e entendido sem preconceitos linguísticos; por outro lado, temos uma postura purista, que argumenta a favor de uma unidade, em detrimento da diversidade linguística que constitui a nação brasileira. Nos seis textos que compõem a polêmica, esses aspectos são retomados. A seguir, analisamos como a matéria citada do The New York Times ressignifica essas polêmicas que giram em torno do nosso idioma, de acordo com o lugar que o sujeito ocupa.
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Considerações teóricas
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Faremos, antes de iniciar a análise da matéria selecionada, breves considerações teóricas que norteiam essa análise. Consideramos o texto em questão como um enunciado, tal como o concebe Bakhtin (1992). Para este autor, o enunciado não se restringe à materialidade textual, pressupõe necessariamente um autor, um interlocutor, um projeto de dizer, uma compreensão responsiva do outro, ou seja: o enunciado pressupõe necessariamente uma enunciação. É nesse contexto que o autor-criador, uma função que dá unidade e acabamento ao enunciado, sempre organiza o todo sígnico em função da compreensão responsiva do outro.
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De acordo com Brait e Melo (2007), o enunciado concreto existe quando há interação entre os participantes da enunciação. As autoras dizem que, para Bakhtin, um enunciado sempre se dirige a alguém, ou seja, possui um destinatário.
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Assim, o enunciado e a enunciação, na obra do autor, estão necessariamente relacionados na produção de sentido. Cabe acrescentar que o enunciado, nessa perspectiva teórica, deve ser relacionado ao mesmo tempo ao contexto imediato e sócio-histórico, deve ser pensado como fruto de um trabalho social, e não individual. Dessa forma, os valores ideológicos interferem diretamente no enunciado.
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Consideremos a definição de ideologia dada por Voloshinov, citada por Miotello: “Por ideologia entendemos todo o conjunto dos reflexos e das interpretações da realidade social e natural que tem lugar no cérebro do homem e se expressa por meio de palavras [...] ou outras formas sígnicas.” (VOLOSHINOV, apud MIOTELLO, 2007, p.169)
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Miotello (2007, p. 172) lembra que, para o autor russo, “as palavras são tecidas por uma multidão de fios ideológicos, contraditórios entre si”, e que
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O signo verbal não pode ter um único sentido, mas possui acentos ideológicos que seguem tendências diferentes, pois nunca conseguem eliminar totalmente outras correntes ideológicas de dentro de si. (MIOTELLO, 2007, p.172)
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Se existem contradições na sociedade, os signos irão refletir e refratar essas contradições presentes na ideologia e nas relações sociais. Essa relação da palavra com os valores ideológicos interfere diretamente em seu sentido. A seguir, resumimos aspectos sobre o sentido nessa concepção teórica. Para Bakhtin/Volochínov (1995), toda enunciação deve ter uma significação e um tema. O tema de uma enunciação é o seu sentido, que só é determinado se olharmos não só as formas linguísticas, mas também os elementos não-verbais da situação. De acordo com o autor, o tema pode variar, ou seja, podemos falar a mesma frase em duas situações diferentes e elas terem significados diferentes. “O tema é um sistema de signos dinâmico e complexo, que procura adaptar-se adequadamente às condições de um dado momento da evolução” (BAKHTIN/VOLOCHÍNOV, 1995, p. 129). No entanto, a significação são os elementos da enunciação que são reiteráveis e idênticos cada vez que são repetidos.
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Cereja (2007) explica que a significação, se comparada ao tema, representa um estágio inferior de significar, porque constrói o sentido com os signos linguísticos e as formas gramaticais da língua. Em se tratando do tema, que para Cereja (2007), representa um estágio superior de significar, pode-se perceber que ele depende não só das formas linguísticas, mas principalmente, da situação histórica concreta, ou seja, dos elementos extraverbais. O tema é instável, depende da situação, do lugar em que está inserido. Portanto, o tema é único e irrepetível.
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Assim, enquanto a significação é por natureza abstrata e tende à permanência e à instabilidade, o tema é concreto e histórico e tende ao fluido e dinâmico, ao precário, que recria e renova incessantemente o sistema de significação, ainda que partindo dele. (MIOTELLO, 2007, p.202)
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Nessa perspectiva teórica, a palavra não é neutra e sim ideológica, pois carrega consigo as vozes dos outros que a utilizam. Os sentidos das palavras se modificam ou se atualizam, de acordo com a situação sócio-histórica em que são utilizadas (CEREJA, 2007, p.204).
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O Projeto de Lei de Aldo Rebelo segundo o The New York Times
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Feitas essas considerações teóricas, passemos à análise da matéria “English is spoken here: too much, some say”, publicada em maio de 2001. O enunciado se inicia com um exemplo, em tom irônico, da situação brasileira frente ao Projeto de Lei do deputado federal sobre o uso de anglicismos. Dessa forma, o autor-criador, no acabamento estético que dá ao enunciado em questão, já indica um lugar para o brasileiro: o de sujeito que pode ser ridicularizado: “If Aldo Rebelo gets his way, it will soon be illegal for Brazilians to go to a ''drive-in'' for a ''hot dog'' and ''milkshake,'' entrust their cars to ''valet parking'' or invest their money with a ''personal banker'' (ROHTER, 2001). O autor-criador escreve de modo a fazer com que o leitor imagine, pelo menos por um instante, a situação engraçada em que nós brasileiros nos encontraríamos se o projeto fosse aprovado. No entanto, logo em seguida, esse autor do The New York Times assume que as atividades em si não serão proibidas, apenas o uso das expressões. Assim, ele diminui o tom de ironia usado logo no início do texto para falar da sociedade brasileira. “The activities themselves will not be prohibited, mind you, just the use of the English-language terms by which they are commonly known here” (ROHTER, 2001).
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Logo em seguida, podemos perceber o olhar desse sujeito sobre o Brasil, analisando os apostos explicativos que usa. Nos primeiros momentos em que fala de Aldo Rebelo, o autor-criador define/descreve o deputado como um membro do Congresso e como comunista, em forma de aposto.
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Mr. Rebelo, a member of Congress, decided to take action after he took offense at the proliferation here of stores with English-language names, like The Pet From Ipanema; Love, Sex and Money, a boutique; World Top Lock; Fashion Mall; Bad Kid; Video Market; and Sweet Way. Why should Brazilians have to feel embarrassed in their own country because they can't pronounce these names?'' said Mr. Rebelo, a member of the Communist Party of Brazil. (ROHTER, 2001)
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Nesse aspecto, enfatiza o partido e a ideologia de Rebelo, retomando, em novo contexto, a crítica de Faraco ao deputado. Mas, nesse caso, no lugar de um norte-americano, trata-se de uma visão que entende o comunismo como inimigo da democracia – em Faraco, não se faz essa relação, pois não se cita o partido político do deputado.
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Além disso, o autor-criador dá acabamento estético ao enunciado citando falas de sujeitos que se opõem ao deputado. Ele constrói a matéria usando falas de Rebelo, por exemplo, e logo em seguida acrescenta uma idéia que não seja compatível com a do deputado. As falas vêm entre aspas pois esse autor faz questão de mostrar seu distanciamento, ou seja, assume que o enunciado não é de sua autoria. A utilização de aspas mostra a manifestação da heterogeneidade mostrada marcada no discurso, proposta por Jacqueline Authier-Revuz (1990). Colocar termos entre aspas significa distanciá-los do sujeito. Nesse caso, o autor-criador se identifica com esse discurso, mas se distancia para manter uma neutralidade. Como exemplo, podemos citar uma parte da matéria em que o jornalista coloca a fala de Ricardo Gouveia Botelho, um web designer.
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Brazil has the largest computer and Internet industry in Latin America, and English-derived verbs like startar, printar, attachar or deletear and the nouns homepage, e-mail, site and mouse are standard usage. ''I think he and the whole idea are nuts,'' retorted Ricardo Gouveia Botelho, a 28-year-old Web site designer shopping at a computer store. ''We use those words because everybody in the world understands them. And what does he plan to do, send the language police to the office to bust us?'' (ROHTER, 2001)
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A idéia de Botelho é: “I think he and the whole idea are nuts”, referindo-se a Aldo Rebelo e seu projeto. A palavra nuts pode ser traduzida para o português como “louco(a)”, “doido(a)” ou “fora de controle”. Se considerarmos a heterogeneidade enunciativa e o discurso relatado (tal como os entendem Mikhail Bakhtin e Jaqueline Authier-Revuz), percebemos o movimento enunciativo do sujeito americano para desmistificar o discurso da promoção e preservação da língua portuguesa, tal qual é proposto principalmente pelo projeto de lei: ele destrói o argumento do outro sem se comprometer com as idéias citadas.
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Outra prova de que a matéria é construída com falas que contradizem as opiniões do deputado é a fala de Sérgio Nogueira Duarte, professor de português que escreve para uma coluna semanal em um jornal brasileiro: “Foreign words are present in any language, and often for good reasons”. Antes disso, nos é apresentada a fala de Aldo Rebelo que diz que não quer controlar a evolução da língua, mas sim evitar abusos. Nessa instância, percebemos que o autor se posiciona contra as idéias do deputado, mas o faz a partir das falas alheias, como é típico do gênero jornalístico que se propõe um posicionamento neutro. O sujeito exime-se da responsabilidade pelo dizer, mas deixa explícita a idéia de ridicularização frente à fala do político, pois acrescentando idéias opostas, induz ao pensamento de que as falas do deputado não possuem valor devido ao fato de que todas as outras apresentadas foram contrárias ao seu argumento.
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Esses discursos diretos que se opõem ao deputado não são falas de linguistas, mas dialogam parafrasticamente com elas: retomam a idéia de que o projeto do deputado é descabido (“I think he and the whole idea are nuts”) e que as palavras estrangeiras são necessárias para as relações sociais (“Foreign words are present in any language, and often for good reasons”).
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Considerações finais
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Não se trata aqui de emitir juízos de valor a favor ou contra o posicionamento do jornalista. O que visamos é perceber a representação que ele faz, do seu lugar político-ideológico, do projeto de lei sobre o uso de anglicismos e do político que o propõe. A análise mostra que se trata de uma representação marcada com valores negativos: a proposta é descabida e seu proponente, comunista.
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Vale destacar que o sujeito fala do lugar em que se acha inserido: o daquele que é superior ao brasileiro, devido ao fato de pertencer a um país de desenvolvimento econômico superior ao nosso (por isso pode ironizar a situação pela qual passaram os brasileiros); o daquele que relaciona comunismo a falta democracia e anacronismo.
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Referências Bibliográficas

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BAKHTIN/VOLOCHÍNOV. Marxismo e filosofia da linguagem. Tradução de Michel Lahud e Yara F. Vieira. 7. ed. São Paulo: Hucitec, 1995.
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BRAIT, B., MELO, R. Enunciado/enunciado concreto/enunciação. In: BRAIT, B. (org.) Bakhtin: conceitos-chave. 4. ed. São Paulo: Contexto, 2007.
CEREJA, William. Significação e tema. In: BRAIT, B. (org.) Bakhtin: conceitos-chave. 4. ed. São Paulo: Contexto, 2007.
FARACO, Carlos Alberto. Guerras em Torno da Língua. Folha de São Paulo, São Paulo, 25 mar. 2001. Caderno Mais!, p. 30-31.
GINZBURG, Carlo. Mitos, Emblemas, Sinais: Morfologia e História. São Paulo: Companhia das Letras, 1989.
MENDONÇA, Marina Célia. A luta pelo direito de dizer a língua: a lingüística e o purismo lingüístico na passagem do século XX para o século XXI. Tese de doutorado defendida no Instituto de Estudos da Linguagem da UNICAMP (Campinas - SP). Fevereiro de 2006.
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REBELO, Aldo. Projeto de Lei no. 1676/99. Disponível em http://www.portrasdasletras.com.br/pdtl2/sub.php?op=polemica/docs/polemica1. Acesso em 09 set. 2008.
______. A Intriga das Línguas. Folha de São Paulo, São Paulo, 15 abr. 2001. Mais!, p. 22-23.
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