Irene Machado
A resposta constitui o núcleo dos estudos de interpretação das formulações de Mikhail Bakhtin que contribuíram para o amadurecimento do debate que busca uma compreensão mais refinada do que se consagrou como arquitetônica da respondibilidade e também arquitetônica da responsabilidade (ver distinção mais adiante). Em ambos os casos, trata-se de uma compreensão dos mecanismos de funcionamento dialógico que se encaminham num sentido oposto ao da mecânica. Ainda que seu funcionamento seja situado no espaço e no tempo, a mecânica se orienta pelas coisas em si, tomadas isoladamente, e não pelo que elas possam significar em suas relações e nos embates de umas com as outras. Num extremo oposto, a orientação dialógica agrega a interação que não harmoniza, necessariamente, conjugações, prevendo dissensões e embates construtivos de sentido no contexto do ato ético. A centralidade da resposta deve ser entendida, pois, como uma alternativa de compreensão do movimento que imprime no ato dialógico uma dinâmica de interações radicalmente alheias ao domínio da mecânica. O domínio dessa compreensão fomenta as investigações sobre a arquitetônica como resposta e ato ético responsável.
Pensada como um domínio de investigação das manifestações que são sempre resposta, isto é, como resultado de ações e reações determinadas por pontos de vista específicos, não mecânicos, a arquitetônica reúne um conjunto de premissas que Bakhtin examina no contexto de suas formulações sobre a criação estética dialogicamente construída. Por mais que busque construir um modelo de acabamento, a visão estética será sempre resultado de visões inacabadas. Esta é a linha de raciocínio que perpassa longos e densos ensaios de um projeto conceitual delineado desde os primeiros estudos de Bakhtin sobre relações interativas, em que a resposta é motor do diálogo e este figura como o precedente fundamental das interações e das articulações, seja da filosofia da linguagem ou da estética. «Arquitetônica da respondibilidade» é a denominação ampla deste projeto conceitual que especula sobre o sentido produzido em relações dialógicas, conforme investigações de Michael Holquist (1990) nos arquivos e escritos inacabados
O termo respondibilidade designa, pois, o privilegiamento da resposta em sua artéria especulativa, isto é, motivadora de outra pergunta, sempre responsável, porque processada pelo diálogo em acontecimento ético[1]. O aspecto conceitual mais problematizador do conceito de respondibilidade é aquele que aponta para o devir e inacabamento. Alinhada a esta projeção, a resposta vislumbra o imprevisível. Apresenta-se como acabamento de algo que é, por si, inacabado, tal como tudo diz respeito ao humano. A resposta surge, então, como gesto vigorosamente especulativo e nos direciona para o potencial interrogante da própria dialogia. Isto porque são os homens os agentes tanto da construção quanto da especulação formulada como resposta. Sem o fenômeno humano nenhuma dialogia seria possível. Nesse caso, a arquitetônica da respondibilidade revela-se um projeto conceitual sobre o espaço das relações dialógicas produzidas pelo homem em seus embates.
O gesto conceitual de Bakhtin introduz um pensamento que se propõe, assim, complementar ao domínio da mecânica com o seu oposto, o domínio da arquitetônica. O mundo das relações arquitetônicas é o mundo do homem que fala, que se interroga sobre si, sobre seu entorno e, ao fazê-lo, articula relações interativas, conflituosas, imprevisíveis capazes, no entanto, de enunciar respostas a partir das quais constrói conhecimentos. Este é o mundo dos eventos, dos atos éticos e da atividade estética de que se ocupou Bakhtin em seus estudos.
O argumento de fundo da formulação que busca compreender o potencial indagativo da respondibilidade entende a dialogia do ponto de vista da atividade interrogante, em que a resposta desencadeia novas perguntas, mantendo vivo, assim, o circuito da respondibilidade. Visto por este viés, a interação dialógica acentua a arena dos conflitos que nunca se acomodam numa proposição e estão sempre em vias de uma explosão.
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[1] Sobre a opção por responsabilidade ver SOBRAL, 2005: 21, 105-6, 110.
A resposta constitui o núcleo dos estudos de interpretação das formulações de Mikhail Bakhtin que contribuíram para o amadurecimento do debate que busca uma compreensão mais refinada do que se consagrou como arquitetônica da respondibilidade e também arquitetônica da responsabilidade (ver distinção mais adiante). Em ambos os casos, trata-se de uma compreensão dos mecanismos de funcionamento dialógico que se encaminham num sentido oposto ao da mecânica. Ainda que seu funcionamento seja situado no espaço e no tempo, a mecânica se orienta pelas coisas em si, tomadas isoladamente, e não pelo que elas possam significar em suas relações e nos embates de umas com as outras. Num extremo oposto, a orientação dialógica agrega a interação que não harmoniza, necessariamente, conjugações, prevendo dissensões e embates construtivos de sentido no contexto do ato ético. A centralidade da resposta deve ser entendida, pois, como uma alternativa de compreensão do movimento que imprime no ato dialógico uma dinâmica de interações radicalmente alheias ao domínio da mecânica. O domínio dessa compreensão fomenta as investigações sobre a arquitetônica como resposta e ato ético responsável.
Pensada como um domínio de investigação das manifestações que são sempre resposta, isto é, como resultado de ações e reações determinadas por pontos de vista específicos, não mecânicos, a arquitetônica reúne um conjunto de premissas que Bakhtin examina no contexto de suas formulações sobre a criação estética dialogicamente construída. Por mais que busque construir um modelo de acabamento, a visão estética será sempre resultado de visões inacabadas. Esta é a linha de raciocínio que perpassa longos e densos ensaios de um projeto conceitual delineado desde os primeiros estudos de Bakhtin sobre relações interativas, em que a resposta é motor do diálogo e este figura como o precedente fundamental das interações e das articulações, seja da filosofia da linguagem ou da estética. «Arquitetônica da respondibilidade» é a denominação ampla deste projeto conceitual que especula sobre o sentido produzido em relações dialógicas, conforme investigações de Michael Holquist (1990) nos arquivos e escritos inacabados
O termo respondibilidade designa, pois, o privilegiamento da resposta em sua artéria especulativa, isto é, motivadora de outra pergunta, sempre responsável, porque processada pelo diálogo em acontecimento ético[1]. O aspecto conceitual mais problematizador do conceito de respondibilidade é aquele que aponta para o devir e inacabamento. Alinhada a esta projeção, a resposta vislumbra o imprevisível. Apresenta-se como acabamento de algo que é, por si, inacabado, tal como tudo diz respeito ao humano. A resposta surge, então, como gesto vigorosamente especulativo e nos direciona para o potencial interrogante da própria dialogia. Isto porque são os homens os agentes tanto da construção quanto da especulação formulada como resposta. Sem o fenômeno humano nenhuma dialogia seria possível. Nesse caso, a arquitetônica da respondibilidade revela-se um projeto conceitual sobre o espaço das relações dialógicas produzidas pelo homem em seus embates.
O gesto conceitual de Bakhtin introduz um pensamento que se propõe, assim, complementar ao domínio da mecânica com o seu oposto, o domínio da arquitetônica. O mundo das relações arquitetônicas é o mundo do homem que fala, que se interroga sobre si, sobre seu entorno e, ao fazê-lo, articula relações interativas, conflituosas, imprevisíveis capazes, no entanto, de enunciar respostas a partir das quais constrói conhecimentos. Este é o mundo dos eventos, dos atos éticos e da atividade estética de que se ocupou Bakhtin em seus estudos.
O argumento de fundo da formulação que busca compreender o potencial indagativo da respondibilidade entende a dialogia do ponto de vista da atividade interrogante, em que a resposta desencadeia novas perguntas, mantendo vivo, assim, o circuito da respondibilidade. Visto por este viés, a interação dialógica acentua a arena dos conflitos que nunca se acomodam numa proposição e estão sempre em vias de uma explosão.
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[1] Sobre a opção por responsabilidade ver SOBRAL, 2005: 21, 105-6, 110.
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