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Bakhtin: ideologia e interação discursiva no “quarto poder”

Cícero F. Barbosa Jr.


Por considerarmos o uso da palavra algo extremamente poderoso, ainda mais quando ela é veiculada a milhões de pessoas. É o que alguns chamam de “quarto poder” (termo cunhado por Lord Macaulay). A via pela qual iremos analisar a reportagem “Lula lança pré-sal com ataque a tucanos” , da jornalista Simone Iglesias e o editorial “Petróleo na urna” , ambos do jornal Folha de S. Paulo, é a do teórico russo Mikhail Bakhtin. Portanto, como vimos na Introdução, entendemos que a palavra além de poderosa ela é um instrumento ideológico , ainda mais nas mãos de um instrumento midiático. Além disso, ele coloca em pauta a importância da multiplicidade de vozes em nosso mundo – “uma lição essencialmente de afirmação democrática e antiautoritária, partida de alguém que era vítima direta da violência stalinista” .

Para iniciar, é preciso estabelecer certa ordenação para estruturarmos a idéia de interação discursiva que Bakhtin propõe, e para isso precisaremos responder algumas questões que serão desenvolvidas no processo de análise: quem é o locutor? Quem é o seu interlocutor? Qual o contexto extra verbal? Qual o tema? Também é preciso tentar entender qual a esfera de circulação, a esfera de produção e a esfera de recepção. Tendo em mente que estas três esferas não estão isoladas, mas todas interligadas.

Dentro desse emaranhado de indagações, não podemos perder de vista que as situações da realidade – as situações da vida – são retratadas no enunciado, que fica entrincheirado entre essa unidade real e os aspectos do discurso verbal. Podemos ainda ressaltar que esse enunciado concreto vislumbra a relação do autor com o seu cotidiano, expondo como ele encara as ligações entre as três esferas mencionadas anteriormente.

Para Bakhtin, a palavra é um signo ideológico, e sendo assim as relações sociais e a comunicação e a interação verbal evoluem nesse processo. A fala, nesse contexto, evolui em conseqüência da interação verbal e o processo de evolução reflete-se na mudança das formas da língua. O teórico russo entende a linguagem sob uma perspectiva histórica, social e cultural, tem sujeitos e discursos imersos nas ideologias que cercam nosso cotidiano.

O diálogo pode ser pensado como uma grande reflexão do pensamento concreto, pois nesse processo encontramos de um lado a comunicação social e sua base econômica, e de outro, a comunicação verbal ou interação verbal realizada em enunciados concretos . É então nada mais do que uma das interações verbais, ou seja, não somente quando duas pessoas estão frente a frente, mas em qualquer troca de idéias.

Desenvolver brevemente este conceito é importante para a discussão de um outro: o dialogismo. Que desponta como uma nova concepção de pensar a realidade humana e não apenas retalhos da existência. A perspectiva bakhtiniana se estrutura a partir da concepção de homem como ser que se constrói na e pela interação, uma visão de mundo ligada sempre em meio à complexa e intrincada rede de relações sociais de que participa. Para perseguir o significado das palavras na fala cotidiana é decisivo recuperar quem fala, em quais circunstâncias, quem participou da situação concreta, qual expressão tinha, como era a mímica ao falar, as nuanças de sua entonação .

Por isso, no processo de análise que vem a seguir, não ficarão de fora. Além da reportagem e do editorial que iremos trabalhar, faremos uma conexão com a manchete, uma manchete mais extensa com letras menores, as legendas das (duas) fotografias, uma citação com letras grandes em um “box” em destaque. Isso se torna possível, pois como diz Beth Brait:

“O conceito de linguagem que emana dos trabalhos desse pensador russo está comprometido não com uma tendência lingüística ou uma teoria literária, mas com visão de mundo que, justamente na busca das formas de construção e instauração do sentido, resvala pela abordagem lingüístico-discursiva, pela teoria da literatura, pela filosofia, pela teologia, por uma semiótica da cultura, por um conjunto de dimensões entretecidas e ainda não inteiramente decifradas” .

Essa analise, onde o fenômeno social está relacionado à interação verbal, passa a depender de uma série de fatores internos e externos que, sozinhos e/ou em conjunto que extrapola os limites do texto e se emaranha nas imagens e em tudo o que faz parte da comunicação, modificam o discurso de modo a obter o efeito desejado, visto que este efeito é permeado de ideologia.



REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

BAKHTIN, Mikhail (V. N. Volochinov). Marxismo e Filosofia da Linguagem. São Paulo, Hucitec, 1995.
BRAIT, Beth. Bakhtin e a natureza constitutivamente dialógica da linguagem. In: BRAIT, Beth (org.). Bakhtin, dialogismo e construção do sentido. Campinas, SP: Editora da UNICAMP, 2005.
CAMPOS, Maria Inês Batista. Questões de literatura e de estética: rotas bakhtinianas. In: BRAIT, Beth (org.). Bakhtin, dialogismo e polifonia. São Paulo: Contexto, 2009.
SCHNAIDERMAN, Boris. Bakhtin 40 graus (uma experiência brasileira). In: BRAIT, Beth (org.). Bakhtin, dialogismo e construção do sentido. Campinas, SP: Editora da UNICAMP, 2005.
SOUZA, Geraldo Tadeu. Introdução à teoria do enunciado concreto do círculo Bakhtin/Volochinov/Medvedev. São Paulo: Humanitas/FFLCH/USP, 1999.


OUTRAS FONTES

IGLESIAS, Simone. Lula Lança pré-sal com ataque a tucanos. Folha de S. Paulo, São Paulo, 01 set. 2009, p. B-1.
PETRÓLEO na urna. Folha de S. Paulo, São Paulo, 02 set. 2009, p.A-2.

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