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Observamos ainda que a publicização dos textos nesse blog atendem especificamente ao objetivo de propiciar a leitura prévia dos participantes do Círculo 2009. Os textos serão devidamente reorganizados e formatados com todas as notas e publicados em Caderno Especial para o evento.

Linguagem e máscaras identitárias, exigências para inserção no mundo global

João Wanderley Geraldi


Ó senhor cidadão, ó senhor cidadão,
eu quero saber
com quantos quilos de medo
se faz uma tradição?
(Senhor Cidadão. Tom Zé)

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1. Velocidade e a mobilidade: embotamento da capacidade de se surpreender
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Boaventura de Sousa Santos (1994), na quinta perplexidade que lança como desafio à imaginação sociológica, afirma que a intensificação das interdependências transnacionais faz com que as relações sociais pareçam cada vez mais desterritorializadas. Os limites antes impostos por elos como nação, costumes, língua e ideologia foram ultrapassados, e a mobilidade de todos por todos os territórios, reais ou simbólicos, poderia ser considerada como uma característica acrescentada àquela com que sempre nos definimos enquanto sociedade moderna – a do tempo e da velocidade.
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Escolhendo o tempo como seu emblema, nossa sociedade fez da mudança acelerada seu apanágio. Sua organização e as estratégias técnicas, econômicas e administrativas que a estruturam estão sempre acelerando a história dos acontecimentos e das invenções (Guillaume, 1998:109). Muito antes de os sujeitos sociais se acostumarem ao recente, outro novo recente já o substituiu. Cazuza cantaria: o tempo não pára!, mas a este tempo não há mais que se dar o sentido tradicional da mitologia do deus Kronos que mata suas criaturas no transcurso do tempo. O tempo da velocidade é o tempo da exigência de um novo contínuo, sem transcurso temporal: tudo é substituído e deve ser substituído com pressa. Gerar o lixo talvez tenha sido a conseqüência mais desastrosa desta velocidade.
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Enquanto homens vulgares, nós nos constituímos pelas táticas infiltradas por hábitos, crenças, representações, resistências. Tudo produto de um tempo não veloz que construiu o líquido amniótico da cultura em que respiramos e com que e em que nos identificamos. Na história (tempo) e na cultura (ação coletiva de homens ao longo do tempo) nos fazemos o que somos. Mas a velocidade das organizações modernas exige outra tática de sobrevivência: há que abandonar identificações culturais, costumes estabelecidos e crenças ou representações para aceitar que o ontem hoje é obsoleto. Na expressão de Bauman (2008:114):
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Na verdade, a mensagem transmitida com grande poder de persuasão pela mais efetiva mídia cultural, a mensagem lida com facilidade por seus receptores é a mensagem da indeterminância e maciez essenciais do mundo: tudo pode acontecer e tudo pode ser feito, mas nada pode ser feito apenas uma única vez e durar para sempre – e seja lá o que for que aconteça, chega sem se anunciar e vai embora sem avisar.
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À aceleração do tempo, a mobilidade num mundo globalizado pelas novas tecnologias, e supostamente também pela economia, parece trazer a pá de cal: as identidades com que nos definimos como pertencentes a uma cultura, a uma nação, a um povo evaporam-se. O sólido estaria se desmanchando no ar. Somos ‘trans’ ou ‘pós’ qualquer coisa que, talvez, nunca tenhamos chegado a ser.
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Dentro destas categorias do tempo e da mobilidade, que identidades os sujeitos sociais devem preencher para transitarem no mundo alargado das relações e espacialmente apequenado graças às novas tecnologias de comunicação? Há inúmeras respostas a esta pergunta. Gostaria de salientar uma delas: a capacidade de não se surpreender.
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Uma das máscaras identitárias sob a qual somos chamados a nos esconder para sermos contemporâneos, atualizados, estarmos neste mundo de vertigem, resulta do embotamento de uma de nossas qualidades: a capacidade de nos surpreendermos. De olhos atentos, uma criança olha o novo com surpresa! Seria gesto infantil o homem atual assumir a mesma posição. Como tudo muda, como tudo se desloca, nada deve surpreender e tudo deve ser tributado ao progresso, ao desenvolvimento, naturalizando esta crescente necessidade do novo. Paradoxalmente, o novo é o que não existia, mas é o que era já esperado. O flâneur não precisa das galerias para se deixar olhar e para olhar. É-se flâneur em qualquer parte: desfila-se virtualmente por toda parte, sempre sem se surpreender com nada porque toda novidade, tecnológica ou não, já estava na ordem do dia, estava por acontecer, viria não se sabia a hora e se faria obsoleta sem qualquer aviso prévio. E o olhar dirigido para todos os lados deve ser móvel, rápido, fragmentário. Quase turista. A mobilidade pelos espaços de outras culturas não dispõe de tempo para qualquer hibridização enriquecedora da experiência humana: o tempo é apenas o do consumo, cada lugar e sua história são mercadorias a serem olhadas, por suas superfícies salientes. O tempo de um flash da máquina fotográfica: registro a ser guardado e rapidamente esquecido por que outra mercadoria já se oferece.
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Como esta sociedade não tem tempo a perder – tempo é dinheiro e tudo se mede pelo dinheiro – os velhos processos de construção de artefatos, entendidos estes como instrumentos forjados ao longo do tempo, imemorial em seus começos, sem assinatura e sem data, mas em constante mutação pela prática humana, deixaram de ser considerados progressos da humanidade, avanços significativos. Vale mais a invenção que se implanta de um dia para o outro, numa vertigem sem tempo para com ela construir artefatos. Não se trata, obviamente, de preferir a enxada ao computador. Trata-se de aceitar que um e outro são produtos do esforço e inteligência humanos. Não se pode esquecer, entre professores, por exemplo, que o quadro de giz também é tecnologia! E que os primeiros professores que os usaram foram presos, porque o quadro permitia tornar a construir, no momento, escritos interpretativos que não pré-existiam ao diálogo de sala de aula. Como a verdade já estava dada, como imaginar construí-la?
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Sem tempo a perder, móveis mobilizados, os sujeitos tem que vestir a máscara: tudo ver, tudo consumir e com nada se surpreender para se mostrar um homem de seu tempo.
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2. O paradoxo aparente ou a construção da capacidade de apagar semelhanças
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Existe outra implicação no desafio apresentado por Boaventura Sousa Santos: a desterritorialização das relações sociais parece construir uma sociedade global sem fronteiras. No entanto, paradoxalmente, basta olhar para os mapas políticos da Europa e África da segunda metade do século XX, e encontraremos precisamente o contrário: a construção de fronteiras com o surgimento de novos Estados, alicerçados precisamente nas características consideradas como limitantes (crenças, costumes, língua e ideologia). A região dos Bálcãs, na Europa, é um bom exemplo do ressurgimento de nações, com o ressurgimento de culturas que pareciam enterradas para sempre depois de tantos anos de ‘unificações’ forçadas (sob os otomanos e depois sob os russos). Também em África, os limites desenhados pelos europeus para suas colônias, e a partir dos quais se quis fundar estados independentes, estão sempre a mostrar que outras são as linhas traçadas pela história, com nações dentro de um Estado, ou com nações divididas em vários Estados. Forçar os limites traçados pela colonização tem nos proporcionado um teatro de horrores. E não porque a África é menos culta. Os Bálcãs ficam na culta Europa, e algumas de suas regiões têm uma cultura multissecular, mas o teatro de horrores é da mesma ordem.
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Isto implica reconhecer que paralelamente (e paradoxalmente) ao lado do processo de globalização econômica se forja um processo de revitalização de diferenças, com regionalismos que identificam cada pequeno pedaço do planeta global. Aliás, a única forma de sobrevida num espaço globalizado é nele inserir-se como distinto para se fazer notado. Eis o paradoxo: para ser global é preciso ser local. Novos Estados surgiram no final do século XX, aparentemente fundados em diferenças culturais essências. Localismos de toda ordem são invocados e sobrepujam todas as semelhanças. Apenas isso, ou há algo mais? Mais uma vez recorro a Bauman (2008: 112-113):
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A riqueza atual dos 358 “bilionários globais” iguala a riqueza combinada dos 2,3 bilhões de pessoas mais pobres (45% da população do mundo). As finanças, o comércio e a indústria da informação globais dependem, para sua liberdade de movimento e para a liberdade irrestrita de perseguir suas metas, da fragmentação política do cenário mundial. Poderíamos dizer que o capital global investiu em “Estados fracos” –isto é, em Estados que são fracos mas, mesmo assim, permanecem Estados. De maneira deliberada ou inconsciente, tais instituições interestaduais exercem pressões coordenadas sobre todos os membros ou Estados dependentes para sistematicamente destruir tudo que possa diminuir o livre movimento de capital e limitar a liberdade de mercado.
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A Espanha pós-franquista também nos dá outro exemplo com a oficialização das diferentes línguas. O ressurgimento orgulhoso do catalão, do galego e do basco, nunca desaparecidos, revela mais do que um simples modismo: é a ressurreição de uma cultura abafada pela opressão e também um modo distinto de se mostrar ao mundo global: mostrar-se diferente[1].
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Não se creia, no entanto, que as diferenças somente se fazem notar entre Estados fracos ou entre parcelas de população dentro dos estados. A sobrevalorização da diferença faz parte da vida privada: a moda e as tribos urbanas podem oferecer um bom exemplo: é preciso ser igual à tribo, mas nela ser diferente nas milhares de mesmas camisetas, mesmas cuecas à mostra com grifes distintas, etc. A moda já passada – como tudo o que vem se vai sem avisar – as cuecas à mostra enquanto moda perderam totalmente sua origem e sentidos históricos: os policiais quando prendiam jovens imediatamente lhes tiravam uma arma possível: o cinto. Sair da delegacia sem cinto, com calça ou bermuda caída, com cueca à mostra, tornou-se símbolo que milhões de jovens pelo mundo adotaram sem sequer saber donde e como surgiu o que agora já foi moda e só distingue os desavisados.
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Na indústria do turismo, é preciso achar um filão, um modo de se mostrar como ‘capital’ de X ou de Y: terra do sol; da areia branca; da igreja antiga; dos cinamomos, ou seja lá o que for que possa movimentar os mobilizáveis turistas. Importa construir uma distinção! Uma distinção que faça também de cada cliente um único, um distinto: tudo será feito segundo o seu gosto, a sua exigência, a sua personalidade: ‘prime’ entre tantos outros, sabendo que somos muitos, mas esquecendo os outros para se representar como distinto. Máscara da distinção. Esquecimento das semelhanças e do destino histórico comum.
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Diz Manoel de Barros
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Nasci para administrar o à-toa
o em vão
o inútil.
Pertenço de fazer imagens.
Opero por semelhanças.
Retiro semelhanças de pessoas com árvores
de pessoas com rãs
de pessoas com pedras
etc etc.
Retiro semelhanças de árvores comigo.
Não tenho habilidade pra clarezas.
Preciso de obter sabedoria vegetal.
(Sabedoria vegetal é receber com naturalidade uma rã no talo.)
E quando esteja apropriado para pedra, terei também
sabedoria mineral.
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Buscar semelhanças entre diferentes: modos solidários de compreender, fonte das metáforas que nos fazem sair do mesmo, ir além. No entanto, entre semelhantes parece que somente conseguimos ou queremos enxergar diferenças. Até a exaustão. Para compreender solidariamente? Para acolher a diferença? Ou para construir nichos de mercado?
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Às diferenças inevitáveis dos processos de constituição das subjetividades que existem mesmo dentro de uma cultura específica, já que cada um de nós faz um distinto percurso de contatos com a alteridade e por isso mesmo internaliza os signos constitutivos de sua consciência em ordens distintas, a atualidade responde de forma verticalizada: é preciso aprofundar as diferenças e construir, com algumas delas, ‘identidades’ que conformem grupos consumidores: étnicos, etários, de gênero, profissionais, doutrinários, etc etc. No capitalismo contemporâneo, a diferença é fabricada. Há um fetiche da diferença em que investe o mercado para dela extrair lucros máximos. Identidades forjadas em benefício da construção de nichos de mercado. Ter identidades múltiplas reduz-se a transitar entre grupos consumidores: a cada vez uma identidade camisa de força em nome da liberdade! Não se trata de enriquecer a subjetividade pelo contato com a multiplicidade. Trata-se de adaptar-se a cada fragmento instantâneo da vida em um das identidades múltiplas disponíveis no mercado.
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Numa sociedade descentrada em benefício da lógica do mercado, da desregulamentação, da concentração do poder econômico em que
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... passamos de uma representação piramidal da sociedade, em que qualquer indivíduo era um cidadão em potencial, com possibilidades de ascensão social, para uma representação vertical dessa mesma sociedade, que separa os que estão dentro daqueles que estão do lado de fora. Esta modificação da nossa visão da sociedade afecta a nossa maneira de ser e multiplica os nossos receios. [...] esta crise da coesão social está ligada à crise da integração social e, portanto, à da identidade. (Mongin, 1998: 73).
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É preciso que se compreenda esta expressão “sociedade descentrada” no seu ponto de origem: vivemos numa sociedade de riquezas concentradas. E para que a concentração permaneça como modo de sermos atuais, é preciso decretar, midiaticamente, a desconcentração, o fim das regulamentações, a suposta liberdade para todos. Decreta-se o fim das meta-narrativas num tempo de implantação de uma única meta-narrativa: aquela da liberdade de mercado.
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E para que isso se faça palatável, entre semelhantes é preciso estabelecer uma diferença. O cômico é que nesta pós-modernidade da diferença, nunca fomos socialmente tão cartesianos! Não esqueçamos que um dos princípios de seu método é: estabeleça uma diferença.
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Ao mesmo tempo em que se esvaziam as condições de possibilidade do exercício da subjetividade, que demanda a alteridade e a solidariedade com a alteridade (isto implica esforço para encontrar semelhanças), aprofundam-se diferenças para construir e justificar distinções, muitas delas criadas pelas desigualdades na distribuição da riqueza, mas camufladas como diferenças.
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3. A servidão voluntária ou a máscara da produtividade
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Não há sociedade de consumidores sem produção. É preciso produzir para ter o que vender, e como é preciso produzir o novo – mesmo que este apenas seja o retoque do existente, desde que apresentado com alardes de novidade – exigem-se inteligências investidas na produção. A máquina faz o que antes a força humana fazia. E o homem (alguns homens, na verdade) incluído no sistema é chamado a ser criador de mercadorias. A exploração capitalista da mão de obra chegou ao intelecto: capacidades de liderança, de improvisação e de criatividade passaram a ser moedas fortes no mercado. E nenhum setor da vida social pode escapar a esta lógica producente. Incluindo a universidade.
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É com a vida universitária que gostaria de exemplificar esta necessidade do produzir constante, ininterrupto, maquínico, ressaltando as formas de sua introdução na vida acadêmica brasileira (mas não só brasileira).
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Deixarei de lado um aspecto deste mundo: aquele da formação universitária que sempre demandou e demandará tempo. Como tempo é dinheiro, uma das formas de superar o impasse foi o aligeiramento nos cursos de graduação, valorizando ao mesmo tempo as atualizações constantes do egresso! Quer dizer, o egresso formado às pressas se fez um nicho de mercado para os cursos que o ‘atualizam’. Não há tempo para qualquer sedimentação. O Tempo Grande, em que a poeira assenta, fazia o leito da cultura, as cascatas das rupturas e os deslocamentos profundos nos sentidos: tudo isso desapareceu em benefício das superfícies, dos pequenos desvãos, dos desvarios da produção em série.
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E tudo é contabilizado, registrado, quantitativamente avaliado. Estabeleceu-se entre os docentes universitários brasileiros uma gincana que se chama DATACAPES: a recolha de informações anuais da produtividade acadêmica. Vale o número de trabalhos publicados. E pasmem: um artigo sobrepuja um livro, porque este resulta de longo tempo de trabalho e aquele apresenta aligeiradamente a novidade. Mas tem mais: uma conferência pública de abertura ou encerramento, proferida em geral por um convidado que se destacou ao longo da vida pelo tratamento dos temas da pauta básica do evento científico, tem menos valor do que uma comunicação, porque esta traz o resultado da pesquisa de ontem, enquanto a conferência é produto de uma arregimentação do pensamento que desvela um percurso longo de vida intelectual.
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Foi preciso responder às críticas dos critérios quantitativistas. Criou-se, no Brasil, um elenco qualificado das revistas publicadas, dos eventos científicos organizados, e muito brevemente sairá o das editoras ‘válidas’. Chamam a isso de QUALIS. Não importa a influência que um texto publicado venha a ter, o que um dito pode mobilizar: importa que ele tenha sido publicado numa revista bem avaliada pelo sistema, mesmo que ninguém o leia além dos pareceristas ad hoc, leitores privilegiados e tidos como especialistas. A partir de supostos critérios de qualidade, cria-se um sistema meritocrático que justificará a concessão de benesses chamadas bolsas de produtividade ou auxílios à pesquisa.
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Estamos todos qualificados. Um artigo não qualifica mais uma revista; e a revista que qualifica um artigo. Conto uma história como me foi contada: uma revista, de que sou membro do Conselho Editorial como ‘especialista’, perdeu sua qualificação elevada de nível internacional A, o máximo da ‘nota’ do sistema, porque não tinha financiamento de nenhum órgão de fomento! Acontece que a revista sobrevive graças ao grande número de assinantes que têm e não precisa de financiamento público específico para sua edição e circulação! Isto, que é um valor em qualquer parte do mundo, até dentro do sistema que transformou conhecimento em mercadoria, deixa de ser um valor porque assim a revista não se submete à apreciação dos pareceristas ad hoc que indicarão se ela merece ou não um financiamento com recursos públicos. Moral da história (desculpem a velha expressão, sei que estamos vivendo uma época pós-moral!): terá que pedir financiamento público mesmo que desnecessário para recuperar sua nota máxima perdida...
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Infelizmente, o Brasil apenas está fazendo o seu ‘dever de casa’. A Europa também está fazendo o seu: a Carta de Bolonha obriga a pasteurizar suas histórias e suas universidades. Apagar as diferenças essenciais em benefício da produtividade; depois, criar artificialmente diferenças para atrair estudantes dos vários projetos de deslocamentos inter-universidades durante a formação.
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Esboçam-se reações: como a publicação no exterior é mais importante do que a publicação nacional[2], e como ‘no exterior’ significa na prática publicar em alguma revista norte-americana ou inglesa, em língua franca (franca para quem?), ou seja, em língua inglesa, intelectuais europeus vem repudiando este sistema de avaliação. Uns porque reconhecem que alguns temas são locais, sem interesse ‘internacional’; outros porque – pasmem! – isso vai significar uma demanda muito grande para as ‘grandes’ revistas, criando dificuldades de avaliação e trabalho inútil de leitura de textos sem interesse geral... No entanto, ao menos no Brasil, o que predomina é o discurso da servidão voluntária: cada qual se safa a cada ano e a cada novo ano novas formas de exigências serão feitas[3]. Até quando?
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Certamente isto tudo está muito longe de nos tornar produtivamente mais humanos[4]. Segundo Bárcena (2001:95), “o que nos faz humanos não é tanto a nossa racionalidade, mas a capacidade para nos deixarmos afetar – na vida afetiva – pelos outros”. Haverá tempo para se deixar afetar quando se tem que produzir constantemente? Na universidade da produtividade não há tempo para o Tempo Grande, nem espaço para a sabedoria, a que Benjamin chamou de lado épico da verdade. Porque sabedoria implica conhecimento e vida, e não mero registro de resultados de experimentos.
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Para finalizar esta discussão sobre a máscara identitária da produtividade, retomo aqui o velho ensinamento bakhtiniano: todo texto entra na cadeia infinita da comunicação; responde e se abre para respostas. Revela uma compreensão e será objeto de compreensão. No mesmo sentido de Bakhtin, Steiner (apud Bárcena, 2001:79) afirma que “a autêntica experiência de compreensão, quando nos fala outro ser humano ou um poema, é de uma responsabilidade que responde. Somos responsáveis diante do texto, da obra de arte ou da peça musical num sentido muito específico: moral, espiritual e psicológico ao mesmo tempo”. Como uma resposta responsável pode ser construída sob a pressão do tempo, da publicação urgente, da produtividade capitalista exigida do meio acadêmico, talvez o que poderia ser o último território de uma reação aos descentramentos da riqueza concentrada?
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4. Em Moçambique, exemplo de multiculturalidade
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Como outros Estados africanos, quase todos resultantes da divisão esboçada pelos potentes países europeus na reunião de Berlim em meados do século XIX, Moçambique é um país com inúmeras nações, algumas delas ultrapassando suas próprias fronteiras atificiais[5] Por outro lado, estes mesmos Estados podem nos ofertar exemplos muito importantes para compreendermos os processos de constituição histórica de identidades, porque nos revelam os conflitos existentes e as vontades políticas de construção de uma unidade na diversidade.
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Usarei aqui um exemplo extraído de um trabalho de Luiza Cortesão e Cuale Maio (no prelo)[6], para discutir o conflito de identidades que se desvela no relato apresentado pelo segundo autor citado, a propósito de um reunião por ele organizada em três encontros para recolher opiniões dos diferentes grupos a propósito dos procedimentos de ensino na Escola Primária Milagros Maboteque, localizado em Maniamba. Os grupos foram constituídos por representantes da comunidade, acompanhados pela anciã e rainha Anathima; 11 autoridades locais e 6 professores. As questões envolvidas diziam respeito ao uso da língua materna na escola (no caso, as línguas Yao e Nynja), e à valorização dos conhecimentos tradicionais da comunidade, num ensino centrado no aluno. Transcrevo:
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Um primeiro debate teve lugar com as autoridades tradicionais de Maniamba. O debate desenvolveu-se tendo como temas:
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Como eram educados nos tempos antigos e como são educados hoje os mais novos? Será que pode ser melhor ensinar a criança partindo do que sabe (ensino centrado no aluno)?

Anathima (anciã) é a mulher mais respeitada na zona e é Rainha, cargo tradicionalmente ocupado por uma mulher que tenha acumulado muitas experiências em relação a usos e costumes de uma determinada região, neste caso Maniamba. Está acompanhada por outras nove pessoas entre homens e mulheres e ela expressou-se em língua materna (Yao): ‘muito obrigado! Estou feliz porque vou falar das minhas dores e das dores da minha comunidade de Maniamba. Antes vou dizer o que ensinávamos aos mais novos, coisas que nós também fomos ensinados pelos nossos antecessores – danças, canções, caças, cerimónias fúnebres, ritos de iniciação, ritos de pedido de chuva, cerimónias de viagem, cerimónias de nascimento de um bebé, …! Tudo que se fazia era preciso de cerimónia (rezar) (para) autorização de bons espíritos”.

A transmissão desses ensinamentos é feita na base da participação directa, física e activa, experimentando tudo na companhia dos mais experientes da comunidade. Muitas manifestações ‘são organizadas em tempos de fortuna’, quer dizer, durante e um pouco depois das colheitas de cada ano. ‘As autoridades do governo nunca poderão fazer parte nestes eventos porque eles têm lugar em tempo de férias (Dezembro e Janeiro), por isso, acho que será difícil chegar-se a um ensino feito com os valores locais’.”…

“Na dança, por exemplo, existiam quatro grupos etários para completar a banda: um grupo composto por mais idosos, um grupo composto por adultos activos, um grupo composto por jovens adolescentes, um grupo composto por crianças mais novas.

Cada um destes grupos tem o seu valor próprio no ritmo da dança o que significa que a falta de um deles cria um fracasso na dança toda! ‘É o que se verifica aqui actualmente em Maniamba e é esta a razão de dizer que ia falar da minha dor e da comunidade porque as cerimónias actualmente são incompletas: faltam os dois últimos grupos (…) Os conselheiros tradicionais, mestres de diferentes áreas, não têm emprego’ porque o que ensinam não tem valor para o mundo de hoje. ‘No tempo colonial, os conhecimentos tradicionais tinham um espaço na comunidade’ embora no ensino formal não houvesse esse espaço.”

“Tradicionalmente não se deve ensinar teoricamente o que se deve fazer numa cerimónia fúnebre, pois que provoca azar. Como muitas outras coisas não se podem transmitir oralmente há por isso necessidade de demonstrar, na prática, e com exemplos concretos.

Nesta sessão em que a Rainha Anathima basicamente falou sozinha em sua língua materna, tendo sido auxiliada apenas na tradução, foi notório o respeito que lhe reservam na zona. Ninguém tentou intervir sem a devida autorização da Rainha.

Foi assim visível que o sistema de ensino incomoda este povo porque cria condições para o surgimento de vários grupos antagónicos, cada um com a sua razão. Este grupo de autoridades tradicionais defende, por exemplo (…) que nos últimos tempos não tem desenvolvido a tarefa de educar a nova geração. Os meninos aprendem no ensino formal a desprezar os seus ensinamentos …”
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Um segundo debate teve lugar com sete elementos das autoridades administrativas:
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O primeiro interveniente disse “não quero deixar de dizer ao promotor deste encontro que somos nós que asseguramos a implementação das leis deste país ao nível desta parcela de Maniamba”. (na minha opinião) … “ o ensino partindo do conhecimento da criança deve ser uma questão mais complexa”… “as crianças sabem antes de ir à escola os ritos de iniciação, isto é, que não devem ir à escola, porque a escola não ensina a enterrar um morto!”… “que valor tem estes conhecimentos?”. Um segundo interveniente afirmou que o que “será necessário é promover muitos passeios na cidade de Lichinga, onde têm sinal televisivo e tem muita coisa boa que o aluno pode reter e não ficar fixado aqui em Maniamba”. Um terceiro interveniente comentou “que vai ser melhor, assim que tivermos energia eléctrica, porque muitos vão projectar filmes de outros países, o que vai despertar nos alunos uma grande atenção por actividades que podem trazer desenvolvimento. Digo isto porque se hoje perguntar a uma criança desta comunidade o que quer ser quando for grande responde que quer ser médico tradicional ou uma outra profissão desta visão limitada de Maniamba”. O quarto participante afirmou que este tipo de ensino (centrado no aluno) “vai trazer aquilo que os regimes passados evitaram e combateram com sucesso: o regionalismo e o tribalismo”. Um quinto participante disse ainda “espero que ao nível central se descubra que este ensino vai trazer graves problemas no seio das comunidades. Se se considerar que Moçambique é um país multicultural que cada grupo cultural valoriza a sua própria cultura me parece que este debate vem valorizar pequenos grupos culturais ao que me oponho”. O sexto participante defendeu: “como é que vamos assegurar a unidade nacional que o novo governo preconiza no seu mandato?”… O sétimo diz: “esta situação vai dar muita responsabilidade ao professor. Tem de ter a capacidade de conciliar os conhecimentos locais com os que o Ministério definiu para todo o país. Mas esta é uma situação difícil se tivermos em conta que os valores tradicionais são expandidos no meio do ano, alegadamente porque existe comida para todos…”
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Um terceiro debate foi realizado com seis professores.
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Um primeiro entrevistado afirmou que “dado o valor dos hábitos locais, pode ser muito difícil (o ensino centrado no aluno) pois requer a capacidade de conhecer esses valores da comunidade. Os alunos daqui, por exemplo, não sabem nada que tenha alguma ligação com os conteúdos de ensino”. Um segundo professor afirma “não quero categoricamente afirmar que os alunos não sabem algo de valor, contudo não têm capacidade de expressão para fazer chegar o conhecimento escondido dentro de si, por causa da língua, principalmente (…)”. “Não estou de acordo com o uso da língua materna…”. Um terceiro critica “para falar de um ensino que se centra no que o aluno sabe, importa dizer que dar liberdade ao aluno desta comunidade seria manter o silêncio na sala de aula” (…) “a título de exemplo, a falta de cooperação desta comunidade em que, em plenas aulas, são levadas crianças para ritos de iniciação até 30 dias fora da escola. Como resultado, estes alunos perdem o ano”. Um quarto professor defende que “ no caso da educação não se deve implementar a democracia porque as crianças ainda precisam de um empurrão” e que “num país em que as realidades são diferentes quer em línguas, quer em hábitos e costumes” “não deve democratizar o ensino”. Mas, o quinto professor afirma que: “o professor precisa de mudar de atitudes”(…)“se se considerar que muitos professores são autênticos mualismos ou catequistas, que seu ensino se baseia na repetição dos seus conhecimentos como acontece nas mesquitas e igrejas” e “o aluno vai também contribuir nestas mudanças de atitude, bastando para isso valorizar as experiências próprias. A comunidade tem que contribuir quer demonstrando suas práticas, quer convidando a escola para fazer parte de diferentes manifestações culturais, ao nível da região, o que vai semear a confiança entre esta e a escola”. Finalmente o sexto afirma: “não acho bom julgarmos algumas crenças como inválidas ou válidas, seja a nível das localidades ou em conteúdos oficialmente decididos pelo ministério da educação. Portanto a expectativa é de experimentar tudo, tanto o currículo local, como do currículo oficial ou geral dito das escolas do país”.
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Há aqui um embate entre culturas distintas, e um projeto de identidade possível no contexto destas diferenças. Uma primeira observação a fazer a respeito da questão da identidade possível é seu caráter volitivo, isto é, uma identidade não é dada e fixada desde sempre e para sempre. Ela é produto histórico e como tal resulta também de volições nem sempre as mesmas dentro de um grupo. Segundo Rajagapolan (2009)[7] , as identidades são performativas e, ainda que históricas e resultantes também de injunções e interpelações, não perdem seu aspecto volitivo. O embate registrado no relato de Cuale Maio contrapõe explicitamente desejos distintos de identidades em construção neste momento histórico de Moçambique.
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Inicialmente, consideremos a fala da Rainha Anathima. O povo é aqui apresentado como vítima de forças que lhe são superiores: as autoridades atuais cujas decisões são tomadas de forma centralizada. Ao mesmo tempo em que vai demonstrando como se ensina na comunidade, como a exigência de convívio contínuo vai constituindo modos de ser e de se identificar com o grupo, acaba por afirmar que No tempo colonial, os conhecimentos tradicionais tinham um espaço na comunidade embora no ensino formal não houvesse esse espaço. Este enunciado pode significar uma ‘saudade’ de um tempo em que cada cultura resolvia seus problemas de formação internamente, uma estratégia do colonizador de aparente não intervenção, com dominação absoluta da produção, da riqueza e das vidas dos colonizados. Mas também pode ser compreendido como um argumento muito forte – especialmente para o projeto central de construção de cidadania unificada com culturas diferenciadas – para alterações nos procedimentos escolares, respeitando não só calendários (épocas de colheita, caça, etc), mas também acontecimentos não previstos, o que exigiria da escola não só a incorporação da cultura local em seus procedimentos, mas um diálogo constante com a comunidade acompanhando sua vida para a ela adaptar a organização dos procedimentos de ensino. Em síntese: um convívio dialógico entre as identidades tradicionais e as identidades outras, possíveis, para estes mesmos sujeitos. Compreender a fala da anciã como uma demanda de imobilidade, repetição constante da tradição ou uma demanda de não intervenções seria desconhecer as táticas de sobrevivência dos fracos. Sob a máscara da vítima há outras indicações: hibridização cultural, tempo de construção desta cultura no diálogo entre aquela dita tradicional e aquela desejada pelo projeto político de nação.
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Os depoimentos das autoridades locais revelam precisamente o aspecto volitivo da construção das identidades: é sempre um projeto político. Trata-se de construir uma nação, construir o homem novo, com base noutra tradição em que civilizar parece significar ocidentalizar. Esta identidade nova, no entanto, esbarra nas identidades pré-existentes e do embate pela força sairão os dois lados da mesma forma que entraram em conflito. Somente o diálogo e o tempo poderiam superar o embate entre a volição e a tradição, mas isto significa abrir mão de um ‘projeto civilizador’ pré-determinado, apostando na história e correndo os riscos da construção de imprevistas identidades. Aliás, esta talvez devesse ser a função real do processo educativo:
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Quando por meio da educação nos pomos em contato com a cultura, nos humanizamos se essa cultura nos cultiva pondo-nos em relação com um contexto mais amplo que o reduzido âmbito em que cremos construir nossa identidade. Por assim dizer, desestabiliza a tranquilidade do nosso ser e de nossa identidade, ao nos por em relação com o outro de nós mesmos, com o que nos é estrangeiro. (Bárcena, 2001:95)
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Os professores desvelam outra complexidade. A identidade profissional se põe em crise quando o ‘ensinável’ deixa de ser fixo. O conhecimento pronto, acabado, a ser ensinado, caracteriza o exercício da profissão, identifica o professor. Quando se abrem as comportas do ensinável, que identidade inventar para o ‘ser professor’? A identidade perdida sustenta os depoimentos aqui relatados. Enquanto não se abrir mão do ensinar, em benefício do aprender com o Outro – e não esqueçamos que o professor é também o Outro do aluno – não se construirão pontes entre a identidade perdida e as identidades possíveis do professor. Isto requer que re-definamos na prática concreta a escola: não uma casa de ensino, mas uma casa de aprendizagem.
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É das experiências de Moçambique e de outros países periféricos que poderão brotar indicações de caminhos desta construção dialógica, respeitosa do que é efetivamente diferença e não desigualdade social. Os chamados países avançados já perderam suas diferenças porque a elas sobrepuseram desigualdades na exploração muita e longa. Não dá para querer chamar agora de diferença o que é produto da desigualdade. E em nenhum deles – periférico ou não - dá para apostar no possível como uma negociação que vai mantendo o sistema de aprofundamento vertical e vertiginoso da desigualdade.
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5. Por fim, um pouco sobre o engano das palavras
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Batizamos como “Princípio de identidade” a igualdade cartesiana: A = A. E talvez tenhamos confundido a identidade com a igualdade. A igualdade se define racionalmente e inexiste na prática. A identidade é volitiva, contém intenção, está longe da abstração matemática. Apesar do logro das palavras, a identidade não tem a ver com o idêntico, com a repetição, com o espelho. O espelho, já ensinou Guimarães Rosa, são muitos. A identificação é produto de aproximações, e a identidade está sempre em construção nestas aproximações. Não se fixa, vai-se fazendo. Por isso é múltipla.
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Somos múltiplos desde sempre, no processo de constituição de nossas subjetividades. Somos semelhantes por vivermos num mesmo tempo compartilhando um mesmo espaço. Mas os percursos não se fazem em série. Somos únicos e irrepetíveis, como os acontecimentos de que participamos. Deles extraímos o que aprendemos, e o que aprendemos somente nos ajuda a reconhecer num acontecimento outro a emergência do passado que adquire agora um sentido outro. Os modos de funcionamento da linguagem talvez possam inspirar nossas ações de construções identitárias.
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A linguagem é uma arma mortal. Como a poesia, está carregada de futuro, mas também de passado. A história da linguagem, a história que nos permite falar, a história de nossos ritos de iniciação – as palavras que primeiro aprendemos a reconhecer e depois a criar por nós mesmos, as primeiras leituras realizadas através das quais começamos a nos amarmos pela primeira vez, pelo mero fato de termos nascido – é a história do que se construiu, do que se edificou, mas é também do que se destruiu. (Bárcena, 2001:115)
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Estar atentos ao futuro, sem querer controlá-lo em suas imensas possibilidades, exige que cuidemos no presente para que a variedade não morra pela foice da desigualdade, pois sua morte significará o desaparecimento do lócus de enriquecimento da experiência humana, enriquecimento que somente tem sentido quando as partes que entram em diálogo dele saiam afetadas, sem querer ser uma a síntese da outra. Que permaneçam ambas, mas nunca iguais depois do contato vivificante das alteridades.
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Para realizar isso, só os fraseadores poderão ajudar:
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Hoje eu completei 85 anos. O poeta nasceu de treze. Naquela ocasião eu escrevi uma carta aos meus pais, que moravam na fazenda, contando que eu já decidira o que queria ser no meu futuro. Que eu não queria ser doutor. Eu queria ser fraseador. Meu pai fico meio vago. A mãe abaixou a cabeça. Então meu irmão mais velho pergunto: Mas esse tal de fraseador bota mantimento em casa? Eu não queria ser doutor, eu queria ser fraseador. Meu irmão insistiu: Mas se fraseador não bota mantimento em casa, nós temos que botar uma enxada na mão desse meino pra ele deixar de variar. Meu pai continuou meio vago. Mas não botou enxada. (O fraseador. Manuel de Barros, do Caderno de Rascunhos).

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[1] Até mesmo diferenças lingüísticas antes consideradas variedades têm sido supervalorizadas e elevadas a línguas oficiais, como é o caso do mirandês, em Portugal. A sobrevalorização da diferença é própria dos tempos que correm, chamados de pós-modernos.

[2] Fiquei surpreso quando soube de colegas portugueses que suas publicações no Brasil não são consideradas como no exterior ou não têm o mesmo peso de uma publicação genuinamente no exterior! Uma nova forma de colonialismo inconsciente estaria se hospedando nas fundações de ciência e tecnologia?

[3] Em certo momento de minha carreira, fui surpreendido por um “Anuário de Pesquisa” publicado pela Universidade. Obviamente a minha e a de muitos outros colegas não eram listadas no Anuário, porque não receberam no ano qualquer financiamento de órgão de fomento!!! Quer dizer, a pesquisa financiada pelo povo paulista que com seus impostos paga os nossos salários não é pesquisa financiada! Ainda que justifique o regime de dedicação integral à pesquisa e à docência! Era preciso mais: ter arranjado algum dinheiro extra para alguma coisa extra qualquer, mesmo que desnecessário, para poder se ver listado no Anuário de Pesquisa!

[4] Antes que a noite chegue, é preciso recordar. Jacques Derrida pediu explicitamente em entrevista a Robert Maggiori para o jornal Libération, em 14 de novembro de 1994, que se repense, em vez de abandonar, a idéia moderna de humanismo. (cfe. Bauman, 2008:25)

[5] A descontinuidade territorial de Angola, por exemplo, somente pode ser explicada a partir da história dos povos que compõem o Estado angolano.

[6] Agradeço à Professora Luiza Cortesão pela amizade e carinho com que me deu a ler os originais deste texto e pela autorização de seu uso antes mesmo da publicação do trabalho.

[7] Conferência “Identidade: uma questão do que queremos ser” proferida no I DIPRACS, 1º. Colóquio de Discurso e Práticas Sociais, realizado na Universidade Federal do Ceará em 12 a 14 de agosto de 2009.
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Referências bibliográficas

BAKHTIN, Mikhail (Voloshinov). Marxismo e Filosofia da Linguagem. São Paulo : Hucitec, 1981.
BÁRCENA, Fernando. La esfinge muda. El aprendizaje del dolor después de Auschwitz. Barcelona : Anthropos, 2001.
BARROS, Manoel de. Livro sobre nada. Rio de Janeiro: Editora Record, 2002.
BAUMAN, Zygmunt. “Unidos na diferença” in. ________ A sociedade individualizada. Vidas contadas e histórias vividas. Rio de Janeiro : Jorge Zahar Ed. 2008. p. 110-126
CORTESÃO, Luiza e MAIO, Cuale. Raízes culturais ameaçadas e/ou sentidas como ameaçadoras?Práticas e inculcação de valores. Porto. No prelo, 2009.
GUILLAUME, Marc. “A competição das velocidades” in. Morin, E. e Prigogine, I. op. cit. p. 103-116.
MONGIN, Olivier. “O desencantamento democrático” in. Morin, E. e Prigogine, I. op. cit. p.65-89.
MORIN, Edgar/PRIGOGINE, Ilya. A sociedade em busca de Valores. Para fugir à alternativa entre o cepticismo e o dogmatismo.
SANTOS, Boaventura de Sousa. Pela mão de Alice. O social e o político na pós-modernidade. Porto:Edições Afrontamento, 1994.
SPÍNDOLA, Pedro (org). Celebração das coisas*. Bonecos e Poesias de Manoel de Barros. Livro/presente em homenagem aos 90 anos do poeta – 19.12.2006. Campo Grande. Projeto, planejamento visual e edição: Pedro Spíndola. pedro@spindola.com.br

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