O gênero charge e a atitude responsiva: uma abordagem enunciativo-discursiva
Elizangela Patrícia M. da Costa – MeEL/UFMT
Ely Alves Miguel - MeEL/UFMT
Introdução
Este trabalho constitui-se das reflexões acerca dos conceitos bakhtinianos tendo como objeto de análise a charge e de como ela pode constituir-se como objeto de formação de leitores em uma perspectiva enunciativo-discursiva. Escolhemos dentre as perguntas apresentadas como a proposição para este trabalho, a que se refere à atitude responsiva. Sabemos, no entanto, que ao optarmos por este conceito, faz-se necessário, em muitos momentos, recorrermos a outros conceitos bakhtinianos, como por exemplo: compreensão ativa, alternância de sujeitos, dialogismo, dentre outros. Porém, para abordarmos todos esses aspectos precisaríamos de fôlego para produzir um artigo mais amplo, o que não faremos aqui. Dessa forma, justificamos o fato de apenas citarmos alguns conceitos, no decorrer deste trabalho, sem nos atermos no aprofundamento deles ao explorarmos o exemplo apresentado. Nosso objetivo na abordagem do gênero charge é o de esclarecer nosso entendimento do que seja atitude responsiva, em uma perspectiva bakhtiniana.
Ao considerarmos os diversos gêneros presentes na esfera escolar, selecionamos a charge, por tratar-se de um exemplar de texto da esfera jornalística, presente, atualmente, na esfera escolar. Compreendermos que esse gênero pode constituir-se como uma boa ferramenta de formação de um leitor mais proficiente. Nossa intenção é mostrar como esse gênero pode ser abordado em sala de aula, em uma perspectiva enunciativo-discursiva. Nosso foco, consiste em pensar a leitura sob a ótica dos conceitos bakhtinianos e de seu círculo sobre a atitude responsiva e compreensão ativa, por entendermos que a leitura só se efetiva no processo de diálogo entre autor e leitor. Tendo definido o recorte deste trabalho, ancoramo-nos nos pressupostos bakhtinianos sobre atitude responsiva e compreensão ativa e criadora, para darmos início às nossas reflexões.
Faz-se mister destacar que vários caminhos poderiam ser percorridos, porém, a natureza do objeto escolhido instiga a nossa curiosidade no sentido de olhá-lo como uma ferramenta possível de formação de leitores, isto porque exige um tipo de leitor perspicaz - que esteja antenado aos acontecimentos sociais e políticos do país e do mundo - um leitor competente e crítico, que seja capaz de estabelecer relações de seu tema com o contexto histórico em que foi produzido.
Gêneros discursivos, compreensão ativa e atitude responsiva
Para Bakhtin (1952-53/2003), os usos da linguagem estão presentes nos diversos campos ou esferas da atividade humana, o emprego da língua se efetua por meio de enunciados (orais ou escritos) concretos e únicos proferidos pelos integrantes de determinado campo ou esfera. Segundo o autor:
Esses enunciados refletem as condições específicas e as finalidades de cada referido campo não só por seu conteúdo (temático), e pelo estilo da linguagem, ou seja, pela seleção dos recursos lexicais, fraseológicos e gramaticais da língua mas, acima de tudo, por sua construção composicional. Todos esses três elementos – o conteúdo temático, o estilo, a construção composicional – estão indissociavelmente ligados no todo do enunciado e são igualmente determinados pela especificidade de um determinado campo da comunicação. Evidentemente, cada enunciado particular é individual, mas cada campo de utilização da língua elabora seus tipos relativamente estáveis de enunciados, os quais denominamos gêneros do discurso. (BAKHTIN, 1952-53/2003, p. 261-262).
Sendo assim, os gêneros do discurso estão presentes em nossa vida cotidiana. Nesse sentido, cada esfera de atividade humana gera tipos de enunciados ou gêneros do discurso, estes, por sua vez, refletem e refratam por meio do seu conteúdo temático, estilo e construção composicional, as condições e as finalidades da esfera em que circulam. Tal como as esferas de atividades humanas, os gêneros do discurso são infinitos, eles nascem, vivem e morrem nas relações sociais.
Antes de aprofundarmos os conceitos bakhtinianos que contribuem para a concepção de leitura como um ato enunciativo-discursivo, retomamos as críticas de Bakhtin/Volochinov (1929) sobre as práticas tradicionais da lingüística no estudo do enunciado. Para esses autores, o enunciado não é produto de expressão puramente, ler não é, portanto, reconhecer as formas lingüísticas, isso reduz o sentido das coisas e nega o caráter social da linguagem. Na perspectiva de Vossler e seus partidários (apud Bakhtin. 1952-53; p. 270) a língua e a linguagem são consideradas apenas do ponto de vista do falante, sem considerar o outro como interlocutor da comunicação discursiva. Sobre esse aspecto, nos diz Bakhtin (1952/53):
A língua é deduzida da necessidade do homem de auto-expressar-se, de objetivar-se. A essência da linguagem nessa ou naquela forma, por esse ou aquele caminho se reduz à criação espiritual do indivíduo. [...] a linguagem é considerada do ponto de vista do falante, como que de um falante sem a relação necessária com outros participantes da comunicação discursiva. (BAKHTIN. 1952-53: p. 270).
Nessa perspectiva, o outro assume o papel de ouvinte, um ouvinte passivo, que não interage com o falante. Ou seja, a multiplicidade de falantes é ignorada na visão desses teóricos. Para Bakhtin essa multiplicidade de falantes não pode, de maneira nenhuma, ser ignorada quando se trata de língua, trata-se, portanto, de um ouvinte fictício, irreal, se considerarmos a comunicação discursiva como um processo complexo e ativo.
Para Bakhtin e seu círculo, o ouvinte, ao tomar parte do discurso, assume uma posição ativa e responsiva ao concordar ou discordar do enunciado vivo do falante. Para ele, toda compreensão de um enunciado vivo é de natureza ativamente responsiva (mesmo quando o outro silencia) e é prenhe de resposta. Nesse momento, o ouvinte torna-se falante. A compreensão passiva é apenas um momento abstrato no qual o ouvinte se prepara para uma resposta ao enunciado ouvido ou lido. Essa resposta pode vir imediatamente à ação ou pode permanecer como uma compreensão responsiva silenciosa, o que Bakhtin denomina compreensão responsiva de efeito retardado: “cedo ou tarde, o que foi ouvido e ativamente entendido responde nos discursos subseqüentes ou no comportamento do ouvinte”. (BAKHTIN. 1952-53; p. 272). Sendo assim, toda compreensão é ativamente responsiva, é inerente ao ser humano essa compreensão ativamente responsiva. O ser humano pressupõe os enunciados antecedentes (todos os enunciados lidos ou ouvidos) e dialoga com eles para proferir seus próprios enunciados. Para tomarmos as palavras de Bakhtin (1952-53), “cada enunciado é um elo na corrente complexamente organizada de outros enunciados”. (BAKHTIN. 1952-53/2003, p. 272).
Pensar a leitura a partir dos pressupostos teóricos bakhtinianos é tomá-la como uma prática social, em que autor e leitor se inter-relacionam em uma situação de enunciação.
Para Paes e Barros (2005), a leitura é um processo de compreensão ativa no qual os sentidos são instituídos no texto a partir de uma relação dialógica entre autor-leitor, leitor e textos e a multiplicidade de linguagens sociais que permeiam essas instâncias.
Para Bakhtin/ Volochinov (1929/2006) a compreensão é uma forma de diálogo, compreender é contrapor à palavra do locutor uma contrapalavra. A significação só se efetiva no processo de compreensão ativa e responsiva (Bakhtin/ Volochinov .1929/2006; p. 132). Essa concepção de compreensão como um processo ativo implica na co-criatividade do compreendente, segundo Paes e Barros (2005). Comungamos com a visão de compreensão apresentada por Paes e Barros (2005) a partir dela apresentamos este trabalho para exemplificarmos que o leitor ao compreender o texto, toma parte dele, tem uma atitude responsiva. Essa resposta só é ativada no momento supremo da compreensão, sendo assim, podemos afirmar que a leitura só se efetiva no momento da compreensão, momento este em que o compreendente (leitor) como co-autor, como o outro que interage com o autor, constrói os sentidos do texto por meio da alternância de sujeitos. A compreensão se efetiva nas fronteiras dessa alternância de sujeitos, no processo de interação que o ato de ler proporciona ao leitor. Para exemplificarmos como esses sentidos são construídos, selecionamos o gênero charge e apresentamos uma breve análise do objeto selecionado.
Charge: Sessão Aerolula – Folha de São Paulo de 06 de outubro de 2007
Folha de São Paulo – 06 de outubro de 2007.
Tomamos este exemplar do texto jornalístico para mostrar como a compreensão é fundamental para que o leitor tenha uma atitude responsiva e construa os sentidos do texto desvendando-o e percebendo a crítica feita pelo autor por meio do humor.
Se não retomarmos, neste caso, o contexto sócio-histórico, o leitor poderá não compreender a crítica. É preciso termos a clareza de que a charge foi publicada em 06 de outubro de 2007 e retoma boatos sobre o fato do Presidente Lula ter assistido cópia pirata do filme “Dois filhos de Francisco” em 2005, antes do seu lançamento oficial, fato desmentido por assessores da Presidência, conforme o boxe abaixo:
Presidência admite que Lula assistiu a DVD pirata
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva assistiu mesmo a uma cópia pirata do filme Dois Filhos de Francisco durante viagem presidencial no dia 18 de outubro.
A assessoria de imprensa da presidência admitiu ao Terra, na noite desta quarta-feira (9), que "a cópia exibida no trajeto presidencial do dia 18 de outubro era não oficial", conforme publicaram os principais jornais de Sâo Paulo.
Ainda de acordo com a assessoria de imprensa do Planalto, ocorreu uma falha da ajudância de ordens, departamento que cuida de pequenos detalhes do gabinete do presidente.
"A ajudância de ordens já foi devidamente advertida", segundo a assessoria. O DVD do filme Dois Filhos de Francisco chega às lojas somente em 7 de dezembro.
Fonte: http://exclusivo.terra.com.br/interna/0,,OI746535-EI1176,00.html
Em 2007, a internet divulga o vazamento do filme “Tropa de Elite”, alertando de que cópias piratas poderiam ser encontradas facilmente em São Paulo.
Cópias pirata de “Tropa de Elite” já podem ser encontradas em todo o país (11/09/07)
O filme “Tropa de Elite”, dirigido por José Padilha, não só abriu precedentes como primeiro audiovisual produzido no Brasil a chegar ao mercado informal antes de ser exibido nos cinemas, como também ilustra a rapidez e poder da pirataria em território nacional. Antes disponível apenas no Rio de Janeiro, o DVD do filme pode agora ser facilmente encontrado em camelôs de todo o país, do Norte, em Manaus, passando pelo Nordeste, em Salvador, e chegando ao Sul, em Porto Alegre.
Como ainda não há material gráfico nem pôster conhecido do filme, as capas dos DVDs são variadas – trazem desde o nome provisório, “BOPE”, adotado durante as filmagens, até logotipos amadores criados pela indústria pirata. Na capital da Bahia, por exemplo, o escolhido para chamar a atenção dos possíveis compradores foi o ator global Wagner Moura, natural de Salvador, um dos protagonistas.
A cópia
Em São Paulo, onde as cópias podem ser compradas sem dificuldade no centro da cidade ou em pequenas lojas de eletrônicos da avenida Paulista, a peça gráfica tenta ser mais elaborada, apesar da péssima qualidade de impressão. Uma foto do Cristo Redentor ao fundo é sobreposta pela imagem de um atirador de elite em roupas negras, mesma cor dos uniformes que os oficiais cariocas utilizam no filme. No topo, uma frase entre aspas – “Polêmico, assustador e perfeito...” – tenta imitar uma prática comum de divulgação, que reproduz frases positivas utilizadas pela imprensa.
A cópia do filme, à primeira vista, parece completa (a não ser por pequenos desajustes no som e pela ausência de créditos finais) e aparentemente é voltada para o público internacional, já que o título (“Police Squad”), créditos iniciais e letreiros são escritos em inglês. Isso fortalece a teoria de que o filme foi copiado por funcionários da empresa contratada para fazer as legendas do longa-metragem.
Internet
Também colabora para a velocidade de propagação o vazamento de “Tropa de Elite” para a Internet. A mesma cópia encontrada nos camelôs está disponível nos sites de compartilhamento de arquivos, inclusive numa versão pronta para ser gravada e reproduzida em aparelhos de DVD. Além disso, sites que oferecem legendas para download prometem para breve os diálogos em inglês do filme, para que estrangeiros – que já demonstram interesse pela obra em grupos de discussão – também possam assisti-lo.
A marginalidade no Rio de Janeiro já foi retratada com alarde pelo bem-sucedido “Cidade de Deus”, por isso espectadores fora do Brasil apresentam agora maior predisposição a filmes de ação com a mesma temática. Impactante retrato do trabalho do Batalhão de Operações Policiais Especiais (BOPE) da PM do Rio, “Tropa de Elite” mostra o dia-a-dia da corporação nos morros cariocas e suas estratégias para combater o tráfico. Como o filme é rico em cenas com práticas violentas e de corrupção da força policial, integrantes do BOPE entraram na Justiça contra a Zazen Produções e a Paramount Pictures (esta última responsável pela distribuição) para vetar sua exibição e, conseqüentemente, evitar danos à imagem do órgão.
Alta procura
A recepção e debate em torno do filme tem crescido tanto que só no site de relacionamentos Orkut existem mais de dez comunidades para discuti-lo, com cerca de 70 mil assinantes no total. Tanta agitação trouxe à tona até boatos de uma continuação, estimulados pelos vendedores de DVDs. Os rumores impulsionaram o surgimento de uma suposta “Parte 2” nos camelôs, que, na prática, são os documentários “Ônibus 174”, filme anterior de José Padilha, que mostrava a mediação do BOPE no famoso seqüestro do coletivo no Rio; e “Notícias de Uma Guerra Particular”, de João Moreira Salles e Kátia Lund.
Anteriormente prevista para novembro, a estréia de “Tropa de Elite” foi adiantada para o feriado de 12 de outubro e tem distribuição internacional a cargo da Weinstein Co., nova companhia dos antigos proprietários da Miramax. A cópia final será exibida pela primeira vez na noite de abertura do Festival de Cinema do Rio, no dia 20 de setembro. A versão pirata, segundo os produtores, é o segundo corte, enquanto a final já é o décimo sexto. A Polícia Civil carioca continua investigando o vazamento do filme.
Fonte: http://ultimosegundo.ig.com.br/cultura/2007/09/11
Sabemos que a pirataria é um crime, sendo, portanto, caso de polícia. A crítica da charge reside na forma como aborda o entendimento do crime pela sociedade. Ou seja, o próprio Presidente da República, autoridade máxima de uma nação, que deve, ou deveria, ser um exemplo de idoneidade a ser seguido, aparece envolvido num ato criminoso.
Ao analisarmos a sentença: “Tropa de elite”? Muito bom cumpanheiro! Assisti esse no mês passado, percebemos que a palavra “cumpanheiro” aparece em destaque no texto, primeiro para retomar uma palavra muito usada pelo Presidente para designar seus aliados partidários, ou aqueles cidadãos que comungam com ele dos mesmos anseios para a sociedade. Mas podemos perceber que a palavra vem grafada com U “cumpanheiro” e não “companheiro”, como normalmente empregada pelo Presidente, para passar a mensagem de que há aí uma certa “malandragem”, já que expressões pronunciadas foneticamente dessa forma (como cumpanheiro (companheiro), cumpadi (compadre)) podem ser observadas na fala dos marginais, membros de gangues, ou entre aqueles que praticam atos ilegais, mas se julgam espertos e donos da situação.
Vejamos que para o leitor compreender o humor e a crítica presente na charge, precisa ter conhecimento prévio dos acontecimentos que antecedem a charge apresentada. Do contrário, o leitor não consegue compreender onde reside o humor e a crítica presentes na charge, e, consequentemente, dar uma resposta ativa ao enunciado. Essa resposta poderá ser o riso e a indignação. Podemos dizer que o dialogismo está no cerne dos conceitos bakhtinianos. Não podemos falar em compreensão ativa e responsiva sem considerar que na perspectiva bakhtiniana a linguagem se concretiza nas relações humanas sociais, a linguagem é, portanto, social e exerce um importante papel na organização da vida sociopolítica e econômica e na formação dos sistemas ideológicos. Há aí, portanto, uma complexa reflexão dialógica entre a linguagem, o social e o ideológico, como pudemos perceber no exemplo acima. O leitor necessita de elementos extra-linguísticos, precisa dialogar com outros enunciados para que a compreensão se efetive e dê respostas a ele.
Sendo assim, podemos afirmar que as enunciações são, portanto, produto dessas interações verbais em contextos histórico-sociais. Como produto desses contextos históricos e sociais, os enunciados estão sempre em contato com outros enunciados, dialogando com eles, que por sua vez geram novos enunciados. Os enunciados têm por característica a dialogicidade, respondem a outros enunciados na cadeia da comunicação verbal. O enunciado está sempre destinado a alguém, um outro, sem o qual não existiria por isso o diálogo é constitutivo do enunciado.
Para ratificar que o conhecimento e o diálogo com outros enunciados são fundamentais para a compreensão ativa e atitude responsiva, reforçamos a necessidade de associá-lo ao momento histórico em que foi produzido, apresentando outros elementos como referências que permita ao leitor construir sentidos ao texto e responder a ele. Ratificamos o que dissemos ao citarmos Bakhtin/ Volochinov (1929/2006) 1: “ todo ato de compreensão é uma resposta, na medida que introduz o objeto da comunicação num novo contexto – o contexto potencial da resposta”. (Bakhtin/ Volochinov. 1929/2006; p. 97).
Se tomássemos o mesmo exemplo sem retomarmos o momento histórico, poderíamos atualizar a expressão “Tropa de elite” para os últimos acontecimentos veiculados na mídia sobre a cassação do Presidente do Senado José Sarney. No dia 04 de agosto de 2009, os principais jornais televisivos focaram as divergências de opiniões dos senadores no que se refere à saída de José Sarney da Presidência do Senado. O Jornal da Globo enfocou a frase dita pelos senadores da oposição de que aqueles que defendem a permanência de José Sarney na Presidência, são a tropa de elite, ou seja, um grupo de defensores de elite, a elite, no caso representa o partido da situação.
Como vimos, trabalhar o gênero discursivo em uma perspectiva bakhtiniana implica considerar o momento histórico em que o texto foi produzido, os enunciados ou acontecimentos com os quais o texto principal dialoga, exige um leitor que esteja antenado aos acontecimentos sociais e políticos do Brasil e do mundo para que a compreensão seja ativa, para que o leitor dê respostas ao que leu por meio de novos enunciados. Sendo assim, só podemos conceber a leitura como processo de compreensão ativa, que se efetiva no momento supremo da compreensão, da co-criatividade, que presume um leitor ativo, compreendente, e, portanto, respondente.
Considerações finais
Destacamos que trata-se de uma breve análise que pretende apenas elucidar a nossa compreensão sobre atitude responsiva. Uma análise mais profunda extrapolaria os objetivos deste trabalho e exigiria aprofundamento de outros conceitos bakhtinianos.
No exemplo apresentado, pudemos verificar que os elementos que constituem a charge são os instrumentos de crítica que descortina a realidade com criatividade e humor: o verbal aliado ao não-verbal e a ridicularização que instauram o riso e a indignação. Elementos que simultaneamente ajudam o leitor a construir significados/sentidos ou a buscar fatos que preencham as lacunas que lhes faltam para a compreensão ativa.
Para Bakhtin (1952-53), toda compreensão ativa exige uma atitude responsiva, uma resposta, ou seja, é este o momento, que no dizer de Bakhtin (1970-71) provoca o “encontro com o que é grande, concebido como encontro com o que determina, obriga, envolve, é o momento supremo da compreensão.” (BAKHTIN,1970-71/2003; p.382).
A charge é um gênero discursivo, que permite, por meio do humor e da crítica, despertar no leitor um olhar para a realidade política, social e econômica da sociedade em que vive, de uma maneira clara e sem máscaras. Ler o mundo significa compreender de maneira ativa os sentidos da realidade e a maneira como ela nos afeta.
Com este trabalho esperamos ter demonstrado que a leitura da charge forma opinião, no momento supremo da compreensão ativamente responsiva. E concluímos citando Romualdo (2000):
A polifonia, a ambivalência e o humor do texto chárgico fazem com que ele afirme e negue, eleve e rebaixe ao mesmo tempo, obrigando o leitor a refletir sobre fatos e personagens do mundo político, uma vez que põe a nu aquilo que está oculto por trás deles. Assim, a charge se mostra como um poderoso instrumento de crítica, devendo ter lugar privilegiado nas instituições jornalísticas que defendem o discurso pluralista. (ROMUALDO. 2000, p. 197).
Bibliografia
BAKHTIN, M. /VOLOCHINOV, V. N. (1929). Marxismo e filosofia da linguagem. 12 ed. São Paulo: Hucitec, 2006.
BAKHTIN, M. (1952-53). Estética da criação verbal. 4 ed. São Paulo: Martins Fontes, 2003.
___________. (1970-1971/1979). Apontamentos In: Estética da criação verbal. (1979). 4 ed. São Paulo: Martins Fontes, 2003.
PAES de BARROS, C. G.“Compreensão ativa e criadora”: uma proposta de ensino-aprendizagem de leitura do jornal impresso. Tese de doutorado apresentada ao programa de Pós-graduação em Lingüística Aplicada e Estudos da Linguagem (LAEL) da PUC-SP, São Paulo, 2005.
ROMUALDO, C. E. Charge jornalística: intertextualidade e polifonia: um estudo de charges da Folha de S. Paulo. – 1 reimp. Maringá: Eduem. 2000.
http://www.folhadeseupaulo.com/2007/10/charge-sesso-aerolula.html. Acesso em 05 de agosto de 2009.
http://exclusivo.terra.com.br/interna/0,,OI746535-EI1176,00.html. Acesso em 05 de agosto de 2009.
http://ultimosegundo.ig.com.br/cultura/2007/09/11/copias_pirata_de_tropa_de_elite_ja_podem_ser_encontradas_em_todo_o_pais_999521.html. Acesso em 05 de agosto de 2009.
1 BAKHTIN/ VOLOCHINOV (1929) em nota de rodapé.
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